28 de Março de 2022 Geral

Estadão: Commodities puxam real

Modelos de Livio Ribeiro, da BRCG e do Ibre-FGV, indicam que, dentre vários fatores, o que mais está contribuindo para recente valorização do real é a alta das matérias-primas.

A alta das commodities é de longe o fator que mais está influenciando a alta do câmbio nominal, de acordo com os modelos de câmbio com os quais vem trabalhando nos últimos anos o economista Livio Ribeiro, sócio da consultoria BRCG e pesquisador associado do Ibre-FGV.

Ribeiro nota que a forte valorização recente do real, cotado a R$ 4,85 quando esta coluna foi redigida, é de forma geral interpretada com três narrativas, não necessariamente excludentes.

A primeira delas é que a taxa de câmbio está mais desvalorizada que o seu nível de equilíbrio de longo prazo e, portanto, existe uma pressão de valorização. Para o pesquisador, essa explicação não é muito convincente, pois o chamado câmbio estrutural (o nível de equilíbrio, para chegar ao qual os economistas empregam diferentes metodologias) é um “atrator” da taxa de câmbio efetiva no longo prazo, mas não explica bem movimentos de curto prazo como o atual.

Uma segunda narrativa é a que chama atenção para o fato de que as moedas dos países exportadores líquidos de commodities estão se fortalecendo desde o final do ano passado. O Brasil faz parte desse grupo, e o real, na verdade, andou até mais que a média dos participantes.

A terceira narrativa volta-se a características específicas do Brasil, como o diferencial de juros (relativamente ao americano, o que atrai capitais) muito alto e uma descompressão do risco país.

No primeiro caso, Ribeiro nota que, de fato, o diferencial entre o juro real brasileiro e o americano no prazo de um ano subiu de um nível em torno de 2% em meados de 2000 para quase 11% atualmente. O problema é que, do final do ano passado até agora, esse diferencial até caiu ligeiramente, enquanto o câmbio saiu de uma faixa entre R$ 5,5 e R$ 5,7 para o nível atual em torno de R$ 4,85.

O argumento da descompressão do risco Brasil é real, na visão do economista. Ele menciona que, em termos do CDS brasileiro (produto financeiro que é uma medida de risco; quanto mais alto, pior), o impacto da guerra entre Rússia e Ucrânia, que levou à piora de risco de várias economias emergentes, simplesmente não ocorreu.

Alguns analistas atribuem a melhora do risco Brasil, considerado relativamente a de outros países emergentes, como possível reflexo de uma melhor aceitação pelo mercado do favoritismo de Lula na corrida presidencial. Ribeiro, no entanto, considera prematuro fazer esse tipo de ilação.

Um contraponto importante feito pelo próprio economista é que seu modelo de projeção de câmbio leva em conta valores nominais e não reais. Essa ressalva é relevante quando se leva em conta que, mesmo com o modelo apontando a alta de commodities como, de longe, o principal fator da atual apreciação, na verdade os termos de troca do Brasil têm piorado recentemente, e não melhorado.

Isso se explica por diversos fatores. Os produtos refinados estão subindo mais de preço do que o petróleo bruto, além da alta forte de itens que o Brasil importa como fertilizantes, níquel, diversos bens industriais, trigo etc.

Mirando o período à frente, Ribeiro é cético em particular sobre a continuidade da descompressão do risco Brasil.

“A guerra da Ucrânia pode ser mais longa e penso que a eleição presidencial no Brasil vai trazer turbulência; tenho dificuldade de comprar a narrativa de que tudo vai ficar bem”, ele conclui.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast (fernando.dantas@estadao.com)

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